TEMPOS
DESAFIADORES!
Vivemos uma crise marcada por tempos desafiadores e pela perda de
consenso. Isto nos desestabiliza em nossas raízes. Rompeu-se aquela unidade de
raiz e já não caminhamos todos na mesma direção. Em vez de existir uma unanimidade e comunhão, não me refiro à
uniformidade, já que nossa riqueza cultural se inspira no respeito em relação à
diversidade, típica do Brasil. Nossa sociedade é hoje plural e policêntrica.
Sentimo-nos dispersos, muitas vezes sem rumo, com dificuldade de captar o
sentido da vida e chegar à verdade. A vida pessoal e social fica cheia de
dificuldades, às vezes até comprometida em seu equilíbrio. Estamos em meio a
uma crise de paradigmas.
Esta situação aponta para uma consciência ética desorientada, numa
“crise em torno da verdade” como escreve São João Paulo II em suas Cartas
Encíclicas Fides et Ratio e Veritatis Splendor. Hoje, o pensar e o
agir partem do próprio indivíduo, o que pode levar a um deslize individualista
comprometedor. Por isso, faz-se necessário acionar a capacidade ética e
teológica, enquanto capacidade humana de discernimento, de examinar tudo, mas
ficar com o que é bom, como nos diz São Paulo (1 Ts 5,21). Se assim for, o ser
humano sentir-se-á respaldado, caminhando mais seguro neste tempo desafiador da
história.
Quantas vezes o novo nos assusta. São tantas as novidades, o que
provoca um certo medo. Por isso, chegou a hora de recriar as bases que possam
sustentar o humanum (o ser humano em
sua raiz mais profunda, chamada também de ethos),
em meio a uma cultura emergente que, marcada pela Modernidade, já é portadora
de traços nítidos da Pós-modernidade. Precisamos dedicar nisto os melhores
esforços, pois aqui se decide o futuro. Precisamos compreender e nos situar
neste novo tempo para alimentá-lo com o Evangelho, colocando Jesus Cristo no
centro. Eis o que nos propõe o Ano Santo do Jubileu Ordinário: Sermos Peregrinos
de Esperança!
Necessitamos de um itinerário ético, com clareza no tocante aos
engajamentos morais, nutridos da fidelidade ao Evangelho, da fidelidade à nossa
história, da centralidade de Jesus Cristo, da experiência de Deus. Só assim
responderemos com adequação e perspicácia aos atuais desafios que enfrentamos,
por conta da Inteligência Artificial, que não poucas vezes tenta tomar o lugar
do ser humano, na Igreja e no mundo. Faz-se necessário apoiar a pessoa humana
em seu processo educativo, no despertar da fé e na formação da consciência; é
um percurso marcado pela unidade da
pessoa, pela gradualidade no passo a
passo que leve à coerência de vida.
Todo este processo tem a ver com a totalidade da pessoa humana, em todas as
suas dimensões: corporal, psicoafetiva, social e espiritual. Não podemos
descuidar dos referenciais que dão suporte para que a pessoa possa crescer em
espírito e vida, como nos diz São João (Jo 6,63).
Além disso, importa anunciar às pessoas de todas as idades uma
proposta de vida concreta e atraente nesse tempo que tanto nos desafia. O
crescimento será contínuo e a conversão permanente, de tal forma que comprometa
a vida das pessoas por inteiro, chamadas a desenvolver a própria dimensão
humana e cristã, na vivência do Evangelho. Precisamos de uma moral que cative
as pessoas a crescerem na graça de Deus, atraídas pelos valores, sustentadas
pelas virtudes, na clareza de uma opção fundamental de vida. Antes de dizer
“não”, pronuncie-se o “sim” a ser buscado, levando as pessoas a crescerem
porque se sentem cativadas, mesmo que algum “não” faça parte do caminho para a
maturidade e a integração. Contemplemos com larga esperança o futuro, porque
somos Peregrinos de Esperança!
Pe. Gilberto Kasper
Teólogo
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