A BIOÉTICA, A ÉTICA DA VIDA!
Pe.
Gilberto Kasper
Mestre
em Teologia Moral, Licenciado em Filosofia e Pedagogia, Especialista em
Bioética, Ética e Cidadania, Professor Universitário, Docente no CEARP – Centro
de Estudos da Arquidiocese de Ribeirão Preto, Assistente Eclesiástico do Centro
do Professorado Católico, Assessor da Pastoral da Comunicação, Pároco da
Paróquia Santa Teresa D’ Ávila e Reitor da Igreja Santo Antônio, Pão dos Pobres
da Arquidiocese de Ribeirão Preto e Jornalista.
O avanço da ciência e da técnica no campo da medicina trouxe
alivio para muito sofrimento. A esperança de vida cresceu. Seu progresso está
na base da explosão demográfica, cujas consequências Malthus pressentiram no
século XIX. O aumento populacional não se deu porque nasciam mais crianças, mas
porque morria menos gente, consequência de novos métodos para garantir a
continuidade da vida.
Interferindo na morte, com uma
redução drástica de óbitos, principalmente de crianças e de mães no primeiro
parto, desequilibrou-se a proporção natural entre nascimentos e mortes. Não
restaria dúvida de que, interferindo artificialmente na segunda, seria forçoso
atacar também o primeiro, sob pena de superpovoar a terra, em poucos anos.
A ciência médica avançou para o
âmago da composição da vida. Chegou ao genoma, cuja descoberta e utilização se situam
entre os três grandes projetos do século XX, que revolucionaram a humanidade: o
projeto nuclear, que vai até à utilização da energia do átomo; o projeto Apolo,
que conquista o espaço; e o projeto genoma que penetra nos segredos da vida e
da genética. Mas logo os três projetos começaram a causar apreensões. A
descoberta da energia nuclear colocou em risco toda a humanidade, tanto pelas armas
nucleares como pela população e o lixo atômico que ocasiona. Há um consenso,
após muitas lutas e movimentos humanísticos, acerca da necessidade, primeiro,
de banir as experiências atômicas ou nucleares, tanto ao céu aberto como
subterrâneos.
As ogivas e os foguetes nucleares
foram uma experiência funesta, que fez trepidar o mundo. As bombas atômicas
sobre Hiroshima e Nagasaqui são um alerta.
A Bioética – Ética da Vida traz
consigo a fundamental tarefa de esticar a vida. Lembro-me que, quando criança
uma pessoa morrendo aos 60 anos de idade, dizia-se que morria velha. Hoje,
quando uma pessoa morre aos 85 anos, ouve-se dizer: “Mas já, tinha ainda uma
vida toda pela frente, logo agora que parou de trabalhar...!” Mesmo com tanto
esforço por mais vida, a Bioética ainda não conseguiu melhorá-la. É visível e
cada vez mais frequente ouvir-se das pessoas, que preferem uma morte mais
natural possível, do que permanecer em Unidades de Tratamentos Intensivos – UTIs,
ligados à aparelhos, na maioria dos casos adiando o momento derradeiro de uma
vida não vivida, por conta da factual Cultura da Sobrevivência. Como seria bom,
se vivêssemos melhor, ao invés de simplesmente sobreviver.
A experiência com o gen humano, com células e embriões, torna-se
uma ameaça, ao mesmo tempo em que constitui uma esperança. Estamos num terreno
em que a teoria passa para a prática, não sem graves riscos.
Para ir ao encontro dessa
problemática surgiu a bioética, como num grito de desespero, não menor do que o
que se opôs às experiências nucleares, lá do fundo da humanidade, para sua
salvaguarda e dignidade. Está em jogo a vida humana. Enfrenta situações
conflituosas, especialmente complexas por ocasião do início e do fim. No início
estão os problemas do planejamento, da gestação, do nascimento. Avançam
propostas de fecundação in vitro, de
anticoncepcionais e de aborto; no outro extremo vem a eutanásia, a morte
clínica, o prolongamento artificial da vida, a supressão da dor...
Mais grave é o problema da
engenharia genética, a biomedicina, a embriologia, a clonagem humana, o útero
artificial, o congelamento de embriões e seu descarte... Qual é sua
justificação moral?
Não se trata, em primeiro lugar, de
uma questão religiosa nem de uma opção confessional. Há algo mais profundo, que
nos leva a tomar posição frente a esses problemas e soluções. É, a salvaguarda
da vida humana, ou melhor, é o bem da própria humanidade, que corre risco de
deturpação. A bioética representa a atitude a ser tomada frente à vida humana,
de seu nascimento, doença, sofrimento, envelhecimento e morte.
A Cultura de Sobrevivência imposta
sobre a humanidade em nosso século denomina uma nação desenvolvida, a partir da
bolsa de valores. É a Economia que determina se uma Nação é ou não
desenvolvida. A pessoa e sua dignidade são apenas um simples detalhe. Enquanto
o capitalismo selvagem sobreviver à custa da dignidade humana, a bioética tem a
tarefa de ecoar ao coração do mundo, que são as criaturas humanas que
determinam a civilidade, o desenvolvimento e a situação digna ou desumana de um
Povo, de uma Nação, principalmente diante dos desafios surgidos de uma
pandemia!
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