COMENTANDO A
PALAVRA DE DEUS
SEXTO
DOMINGO DO TEMPO COMUM
Meus queridos
Amigos e Irmãos na Fé!
“Os olhos do Senhor estão voltados para os que o temem.
Ele conhece todas as obras do homem” (Eclo 15,20).
No Sexto Domingo do
Tempo Comum a Palavra de Deus nos ilumina sobre a relação de Jesus e a lei. Sua missão não é
abolir nem facilitar, mas libertar do formalismo e do fundamentalismo. Para
Jesus, não basta a observância externa apenas para “ir para o céu” após a morte. Jesus exige radicalidade. A Palavra de Deus deve atingir até o mais profundo do ser humano. É uma procura
amorosa da vontade original de Deus que ultrapassa a simples letra da lei. É
necessário ver e ouvir por “trás das
palavras”, encontrando-se pessoalmente com o Espírito da Lei.
Para o cristão ser justo, conforme a
exigência de Jesus, não basta observar preceitos, cumprir mandamentos, é
necessário viver e realizar o bem proposto por Deus em sua Palavra. A letra da
lei mata, mas o Espírito vivifica. Conforme o Salmo 119 (118), a lei é uma luz,
um caminho, razão de viver e se sentir interiormente como povo escolhido de
Deus. A lei foi dada para podermos viver e testemunhar o bem que Deus propõe.
Jesus nos alerta que podemos
observar a lei em outro espírito, que não seja o Espírito de Deus. O espírito que
motivava os fariseus da época se afastava do projeto do Pai, porque não beneficiava
os pobres e pequeninos. Não era espírito de Deus, mas um negócio com Deus,
troca, barganha. Os fariseus tornaram-se donos da lei e ela passou a ser
instrumento de dominação econômica, política e religiosa sobre os demais: “Amarram pesados fardos e impõem-nos aos
ombros dos irmãos, ao passo que eles mesmos se negam a movê-los com o dedo” (cf. Mt 23,4) Jesus, então, deseja tirar a lei das mãos de quem oprime em nome
de sua observância e devolvê-la a Deus. O que Deus deseja é a justiça, seu
plano amoroso. Procurar a justiça
verdadeira é olhar a vida com amor radical. Então os mandamentos de Deus significarão muito mais do que a
letra diz, e nos levarão à perfeição de filhas e filhos de Deus.
Cumprir toda justiça é a justiça que
inclui lei e profetas. O essencial da lei é a prática da justiça e da
misericórdia que ultrapassam a observância legalista. Jesus toma alguns
exemplos para deixar claro até onde devem ir a justiça e a misericórdia. Vai
até a raiz e mostra que o objetivo da lei é a defesa da vida. Não basta “não matar”, é necessário construir uma
sociedade humana, fraterna e solidária, na qual a vida plena seja para todos. A
lei é “não cometer adultério”, mas não;
é preciso eliminar o desejo de posse sobre a mulher, extinguir todo machismo e
todos os privilégios do homem, raiz de toda opressão presente nas relações
humanas. O bem-querer é a proposta de
Deus. Nossa resposta é um amor verdadeiro, com raiz na totalidade
da pessoa, o qual se insere na fonte do amor que é o próprio Deus. Não basta “não jurar em falso”; temos que promover
a convivência fundamental na verdade, na integridade, na honestidade, na ética.
O que a Palavra de Deus exige hoje de nós é cortar o mal pela raiz. Jesus não nos
prescreve apenas normas, mas uma proposta evangélica nova que batize, lave até
nosso inconsciente, nossa consciência profunda, e faça da vida um contínuo ato
de discernimento, de busca de sentido de nosso ser, de nosso viver, do nosso
agir. A primeira leitura nos convida, a cada momento, a tomar uma posição
diante da LEI, o projeto de Deus.
Somos convidados a uma profunda conversão em todas as dimensões de nossas relações humanas. Na dimensão
familiar, evitando acepções e discriminações. Na dimensão política não poucas
vezes a lei é aplicada com maior rigor aos adversários políticos e relaxada aos
correligionários, o que é profundamente injusto. A lei deveria ser aplicada de
igual modo a todos, já que todos
deveriam ser tratados com igual cidadania. Na dimensão social o jogo de
interesses determina a lei, quando não a “Cultura do Descartável”. Quantas pessoas
conhecemos, que só sobrevivem à custa do dinheiro, do prestígio, do poder, da
ganância e da avareza? Na dimensão religiosa também carecemos de séria conversão pastoral. Nossas normas pastorais nem sempre são acolhedoras; mais
espantam do que acolhem os filhos da Igreja. Não se trata de “banalizar” a
pastoral, mas também não dificultar a vida dos que nos buscam sendo-lhes um peso
sobre os ombros. As secretarias paroquiais geralmente só dão expediente em
horário comercial, quando as pessoas trabalham. Se a Igreja é Mãe, seus filhos deveriam encontrá-la sem que isso prejudique sua
sobrevivência. Gosto de pensar, que a Igreja deve sempre edificar e nunca dificultar a vida de seus filhos nas
dimensões: pessoal, familiar, profissional e social. Muitas vezes somos mais
exigentes com nossos Agentes de Pastoral, do que foram os fariseus do tempo de
Jesus. Fazê-los nossos “funcionários” e exigir que deixem o convívio da família
não me parece o projeto de quem diz amar seu rebanho. Como seria bom, se todos
nos propuséssemos a uma verdadeira e
profunda conversão, deixando a
última palavra para o amor totalmente gratuito. Se nem Deus impõe nada, apenas propõe, quem somos nós para
exigências tantas vezes absurdas, que demonstram nossa incapacidade de conduzir
as pessoas a Jesus Cristo livremente? Sejamos humildes e nos esforcemos por
maior criatividade e, sobretudo coerência entre o que pregamos e
vivemos!
Desejando-lhes muitas bênçãos, com
ternura e gratidão, o abraço amigo,
Pe. Gilberto Kasper
(Ler Eclo 15,16-21; Sl
118(119); 1 Cor 2,6-10 e Mt 5,17-37).
Fontes: Liturgia Diária da Paulus de Fevereiro de 2020,
pp. 64-67 e Roteiros Homiléticos da CNBB do Tempo Comum (Fevereiro de 2020),
pp. 70-7
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